quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Se te amo?

- Me dá uma lembrança, a mais pura que seja. A primeira que te vier à cabeça, vai!

Era outono. Setembro de oitenta e quatro.
Lembro-me até hoje das inúmeras folhas espalhadas pelo chão, seu cheiro no meu vestido. Você se deitava em meu colo e eu lhe fazia cafuné enrolando os cachinhos do cabelo. Tão doce, tão calmo.
Quando poderíamos imaginar, hãn?
Você com aqueles olhos castanhos brilhantes, cheios de sonhos e ambições. Planos pro nosso futuro, pro seu futuro.
Tudo em você era perfeito, e a minha perfeição era me encontrar nos teus segredos, tão obscuros e inquietos nesse peito frágil.

A gente sempre se amou, se apaixonou, se viveu não é? Sempre um cuidando do outro, defendendo quando esse precisava. Você me carregava nas costas quando chovia, pegava na minha mão sem hesito quando eu sentia medo. Me ensinou a dançar, me entendeu, me decifrou e depois sumiu.

E agora, amor? O que aconteceu com nós dois?

Te esperei, juro que esperei! Fiquei plantada durante vinte anos esperando que aquele bobo que se camuflava de pegador das menininhas do colégio me ligasse desesperadamente com voz de quem precisa reencontrar a amiga pra relembrar os velhos tempos, mas nem isso.

E o nosso trato? Se com trinta ambos ainda estivessem solteiros, no casaríamos, mesmo sem amor. Pelo menos a gente ia rir e fazer sexo, coisa que a maioria não faz.

Aí você me aparece hoje, completamente molhado, descabelado, sujo, aos prantos e pedindo que te diga se sinto sua falta? Se te amo?

Depois de todo esse tempo sim, eu ainda sinto a sua falta. Depois do meu casamento mal sucedido, meus filhos formados, minha carreira no topo e meu garotão de vinte e poucos na minha cama todas as noites… Sim, eu ainda sinto a sua falta.

Se te amo? Desde o momento em que te vi pela primeira vez com aquele cabelo ridículo arrepiado e um brinco super cafona na orelha esquerda, mas acabou.

Eu sempre te olhei diferente, te encarei e dancei com você. Sempre nos emaranhávamos em ideias exclusivas de nossa imaginação. Mas aí você partiu, e eu fiquei sozinha. Sendo obrigada a enfrentar a pressão de crescer independente, chorando por aqueles que me feriram, sorrindo conforme a vida me sorria, vivendo sem a tua presença.
Depois de tanto tempo te esperando, acabou.

Mulheres nasceram pra gostar de caras como você, querido. Bonitos, inteligentes, bons de cama e que sumam durante um bom tempo as fazendo sofrer por metade do que elas já viveram.
Se te amo não importa. Você se tornou mais um desses que não dão valor a garota certa, e agora eu estou bem.
Bem assim, sem você.

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